sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Um ensaio sobre a genialidade

Antes de escrever qualquer coisa sobre este assunto e ser taxado de pretencioso ou arrogante, digo que escrevo a minha opinião. Nada mais e nada menos. Não é onipotente e muito menos uma verdade absoluta, mesmo porque tal coisa não existe - isso é outro assunto.

A genialidade normalmente é descrita por feitos humanos inusitados e originais. Normalmente. Algo prodigioso pode ser considerado genial - e deve. Mas o genial não se detém somente a feitos únicos e revolucionários.

Existe a genialidade mais banal, não pela simplicidade, mas pela cotidiana presença. Acho totalmente genial aqueles que conseguem ver tudo de forma única. Ver uma árvore não como uma árvore mas como aquela árvore ou ver um cachorro como aquele cachorro, e em cada uma dessas situações saber que aquilo é único. Sei que esse tipo de discurso facilmente veste a camiseta de lugar comum como "a vida é genial", mas eu não falo da vida, falo em ver a vida. Olhar e ver. Yussuf, antigamente chamado de Cat Stevens, diz "eu olho e eu vejo", ou seja, eu olho uma casa e eu vejo o que é uma casa - o que é para mim, o que pode ser para quem vive nela, o que virá a ser para seus futuros moradores e demolidores, o que será ali e se será. Muitas vezes esses pensamentos não vão tão longe, mas dar um passo na imaginação é também permitir ver o mundo sempre como é e como pode ser. Ninguém vive no mesmo mundo. A aparente inutilidade de um bando de formigas na grama é igualmente genial quanto anos de pesquisa pelo mapeamento completo do Genoma Humano. Tudo depende de quão genial nós nos permitimos olhar e ver.
As vezes eu tenho a nítida sensação de que todas as palavras tem vida própria. Vida não seria a melhor palavra. Vida tem o escritor e suas experiências. Vida tem o leitor e seu deleite. Já as palavras não tem esse tipo de vida. São, assim como os vírus, vivas e mortas.

Quem escreve esta infectado com palavras. Em uma crise de gripe silábica, ele escreve textos ou até mesmo um livro. Aqueles que vivem escrevendo são pobres doentes terminais, fadados a passar sua existência entre duas linhas.

As palavras são vírus que não possuem cura. Quando não estamos sofrendo de seus efeitos maléficos apenas não escrevemos. Quem sabe escrevemos algo por mero instinto hipocondríaco, mas isso não é um efeito claro das palavras.

Quando somos afetados pelos seus efeitos sentimos na hora que elas estão vivas. Que não depende de nós decidir se isso ou aquilo será escrito. Quiçá escolheremos o título dessa febre. As vezes somos acordados para ajeitar as palavras entre si para que não briguem com impiedosos golpes gramaticais. Mas a verdade é que no turbilhão da febre sentimos um calor que vem de dentro e se converte em energia para mover rapidamente nossos dedos, sem fala na velocidade do mundo - ah! A velocidade do mundo - que sem mais nem menos pára e fica num canto perdido. Apenas as palavras andam e nos deixam como espectadores.

Nos momentos de febre, o mundo mais parece o quarto ao lado.

Sei de loucos que voluntariamente se deixam infectar cada vez mais por este mal, lendo livros com milhões de manifestações de outros infectados.