CONTOS DA GAVETA
- Detroit 3, chamando! Detroit 3, chamando!
Apenas estática vinha do fone daquele obsoleto telefone vermelho. Contudo, tinha a sua importância, uma vez que era a única peça decorativa e o único meio de comunicação com o mundo que havia dentro daquela sala.
O homem que segurava o telefone permanecia imóvel. Seu terno azul-cinza deixava claro os dias que acompanhava aquele cansado corpo. Cada canto da sala permanecia em quase total silêncio, apenas interrompido pelas baforadas de cigarro, os altos gritos desesperados emitidos ao telefone e pelo zumbido de de dois grande tubos de lâmpadas fluorescentes.
Finalmente, como um boxeador nocauteado a mão que segurava o aparelho encontrou o gancho e colocou um fim à estática. Agora, apenas as baforadas e o zumbido estagnavam o ambiente.
Foi a vez de outro objeto da sala - que, sem contar com uma cadeira de metal, era o último objeto a ser descrito na narrativa dos acontecimentos desta data - a ser foco da atenção do único ser ainda vivo daquela sala: uma escrivaninha.
Uma das gavetas foi aberta. De dentro foi tirado um pequeno frasco contendo uma solução aquosa levemente alaranjada. O cigarro foi ao chão e um sapato terminou o serviço de aniquilá-lo. O frasco foi aberto e a solução escorregou levemente pela garganta do seu portador, que, por sua vez, deixou cair o frasco, sentou flacidamente na cadeira e lá ficou com o corpo completamente solto e com o olhos arregalados encarando o teto.
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